segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Além da razão

Terminei neste fim de semana de ler "Morangos Mofados" (Caio Fernando Abreu). A primeira vez que li esse livro foi em 1996 e, na época, ele não me pareceu nada demais. Mas, agora, na releitura, ele me "pegou" e achei-o muito mais incrível que da primeira vez.

Foi uma leitura de (re)descoberta, daquelas que a gente faz aos poucos, a conta-gotas, para que o livro não acabe. Fiquei "morando" no livro, como disse um amigo. Fiquei querendo decorar os trechos, para depois me lembrar deles, para, de alguma forma, represar aquele encantamento, aquele primeiro impacto, aquele maravilhamento que a leitura me causou.

Fiquei procurando razões racionais. A voz narrativa de "Morangos Mofados" é muito poderosa. A literatura confessional cola o narrador ao ouvido do leitor. Eles trocam segredos, confissões, cartas. Eles se identificam nas fragilidades, nas transgressões, nos desejos, nos sonhos irrealizados. Mas isso é o racional.

O que me aconteceu - e foi inédito numa releitura - foi esse livro me pegar bem pelas entranhas.Foi ele ter-me tocado a alma, foi ter-me agitado o espírito e acendido o olhar para recantos algo adormecidos.

Ali, escritas, experiências tão diversas das minhas experiências, de repente faziam um sentido transcendente para mim. De repente significavam algo que eu ainda não consegui decifrar completamente.

"Morangos Mofados" me pegou de assalto e eu ainda não sei bem o porquê. Ele tocou em mim em algo para além das explicações racionais. Por isso, talvez, deem a isso o nome de arte. Foi para mim uma epifania. Como dizem os franceses, étonnant.