sábado, 15 de março de 2014

Origem de uma paixão (melhores momentos)

A pergunta, diagramada num daqueles quadrinhos típicos de Facebook, era: "Qual escritor fez você se apaixonar por literatura?". Poderia parecer simples para alguém que como eu, tem paixão por livros, línguas e literatura. Mas, para meu próprio espanto, não foi simples responder.

O óbvio seria responder "Machado de Assis", tema do meu Mestrado. Só que a verdade é bem mais complexa que o óbvio, tanto na vida real e em suas questões metafísicas quanto numa pergunta aparentemente simples.

O fato é que eu não sei de onde vem essa paixão, essa ânsia, esse tesão por literatura. Por estranho que pareça, a mim parece que essa paixão é construída ao longo de uma história que está longe de terminar, mas que eu não sei onde começou.

Várias vezes, durante minha longa vida de leitora, um livro me arrebatou; alguns autores levo-os no coração e na cabeceira, leio-os, releio-os e sempre me parecem novos. Mas, sim, existem alguns marcos.

Não me esqueço do primeiro "livro de gente grande" que li, aos seis anos de idade: Sandra na Terra do Antes. Eu o chamava assim porque ele não tinha figuras; só texto. Não esqueço de, às escondidas, com uns oito ou nove anos, subir em banquinhos para alcançar nas prateleiras mais altas da estante da sala  livros de Sidney Sheldon, que meus pais diziam que era "livro de adulto". Lia-os na ânsia de descobrir porque eles não eram para minha idade e, logo depois, passei à Agatha Christie. Tudo graças ao Círculo do Livro, uma espécie de clube de vendas por catálogo que fazia os associados realizarem compras mensais de "grande obras da literatura". No colégio, descobri clássicos como José de Alencar e Machado de Assis. Mas não me esqueço mesmo é de Pedro Bandeira e de A Marca de uma Lágrima.

Na adolescência, li Clarice, Pessoa, Machado e Nelson Rodrigues, autores de alguns dos meus livros de cabeceira. A faculdade foi um tempo de ebulição. Descobri muitos autores novos (para mim), como Borges e Cortázar, que até hoje releio: são fundamentais. Caio Fernando Abreu e Leminski, com cujas obras tive contato nessa época, foram reveladores. Nessa época, também, eu decidi estudar francês por causa de um livro que ganhei dos amigos, no meu aniversário de 19 anos: uma edição bilíngue de As flores do mal, que me fascinou. Mas a "formação" de minha paixão não acabou na adolescência. Tardiamente, depois dos 20, descobri Ana Cristina Cesar e acompanhei em "tempo real" - desde a época do CardosOnline - o surgimento de autores que hoje eu adoro, como Daniel Galera.

Por tudo isso, me parece complexo, impossível e injusto dizer que um só autor teria me despertado a paixão pela literatura. Espero que novas descobertas de velhos autores e novos autores estreantes continuem instigando essa minha paixão.



segunda-feira, 10 de março de 2014

Reencontros

Por diversas razões, tenho pensado muito no tema "reencontros". Não exatamente reencontros com pessoas, mas reencontros com ideias e desejos, aspirações e inspirações.

Neste final de semana que passou, por exemplo, eu me reencontrei com uma canção, Starman. Fui à imperdível exposição sobre David Bowie (em cartaz até 20/4/2014), de quem aprendi a gostar tardiamente, influenciada pelo Darcio Ricca (na época meu namorado; hoje, marido).

O problema é que, quando comecei a gostarde Bowie, já tinha passado os primeiros anos da adolescência ouvindo a versão brasileira de Starman, que o Nenhum de Nós batizara de O Astronauta de Mármore. Sim, Starman é muito mais legal; sim Bowie é um grande artista, absolutamente revolucionário. Mas por alguma razão - talvez a letra difícil, talvez o costume de recorrer à primeira versão que conheci - Starman nunca fora uma canção que me tivesse tocado profundamente.

Até que eu me "reencontrei" com ela na exposição. Não só com ela, mas com a histórica apresentação que Bowie fez no Top of the Pops e com a letra manuscrita pelo próprio autor, rabiscada, editada, repensada por ele. Claro que a exposição ajuda, cria um clima favorável para que você se envolva. E eu realmente  me emocionei.

Ver aquele manuscrito teve o mesmo efeito, em mim, que ver uma obra de arte. Foi como se, antes daquele momento, eu só tivesse ouvido reproduções da obra, que não me deixassem tomar contato com sua aura. E, de repente, eu ressignifiquei Starman. E, como que num passe de mágica, comecei a gostar dessa canção como nunca antes gostara. Eu a reencontrei e a compreendi, como se nunca a tivesse ouvido antes.