quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Uma década de tradição de Natal


Na minha família, não temos muitas tradições, objetos passados de mãe para filha, coisas que tenham história e raiz. Mas tem uma coisa que dá orgulho: o Natal.

Natal, normalmente, pelo que me dizem, é uma festa "obrigatória" de família; um momento em que as pessoas "precisam" ou "devem" ficar junto dos seus. Nas redes sociais, pipocam piadinhas de que Natal é tempo de desejar o melhor para gente que mal falou com você durante o ano todo; época de responder a perguntas indesejadas de parentes ausentes.

Na minha família, não é assim. A gente espera pelo Natal, a gente gosta de se reunir, de fazer farra, de cozinhar muito, de comer crústole (uma receita que passou da minha avó para minhas tias e que na nossa família só se come no Natal), de lavar muita louça, de cantar, de rezar ao redor da ceia, de receber os amigos queridos, de acolher os "desgarrados" sem festa, de jogar vídeogame, de ver fotos antigas, de receber o Papai Noel.

O Natal na minha família é tempo de abraços sinceros, risadas desbragadas, lágrimas emocionadas, orações, música e muita, muita gente junta. Mas, estranhamente, nunca pensei nisso como uma tradição.

Para mim, a verdadeira e singular tradição do Natal na minha família nasceu em 2004. Naquele ano - meu avô já havia morrido e não viveu para ver - minha tia Nori deu de presente para cada família um pequeno anjo de resina transparente para pendurar na árvore de Natal. Todas as árvores teriam aquele anjo igual dali em diante.

Não sei como, a ideia pegou. Em 2005, todo mundo apareceu na festa de natal com um presente para a árvore das famílias. Eu, que já era casada, tenho a sorte de ter todos os presentes, desde o primeiro, na minha árvore. Neste ano, a Gabi, que foi morar sozinha, distribuiu pela primeira vez o enfeite dela para as famílias. E foi lindo ver tudo se multiplicar mais uma vez.

Atualmente, como minha árvore de Natal é pequena - porque o apartamento é pequeno - só tenho esses enfeites nela. Bolinhas normais já foram abolidas.

Então, todos os anos, quando montamos a árvore de Natal, eu e o Darcio fazemos disso um ritual. Sentamos com calma, enfeitamos com carinho cada galho, lembrando da história de cada enfeite e de cada pessoa que nos presenteou com anjos, sininhos, nossas-senhoras, tamborzinhos, papais-noéis, bolinhas, estrelas, pinhas, mini-presépios e até um buda de tecido. Nesse momento, a gente pára para refletir o quanto somos felizes, e como é grande a nossa riqueza. É o momento do ano em que nos lembramos de cada pessoa que está ao nosso lado. Depois, com a árvore montada, rezamos. Em agradecimento ao ano que passou, para pedir por nós e por cada pessoa, representada naqueles presentes, para o ano que virá.

*A foto é da árvore aqui de casa, já com os enfeites recebidos neste ano.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Liberdade limitada não é liberdade

Adoraria começar o ano dizendo "Feliz 2015!". Mas hoje é dia 7 de janeiro e, parodiando uma velha música punk, "Paris is burning". Terroristas mataram 12 pessoas, entre elas, cartunistas do Charlie Hebdo.

Teoricamente, até onde eu entendo - porque eu NÃO consigo entender uma pessoa que mata a outra - essas pessoas foram mortas porque fizeram piada com a fé alheia. O que me deixa chocada é essa ânsia de calar o outro, metafórica e, neste caso, literalmente, apenas por discordar. Se você tem fé de verdade em uma coisa (uma pedra, um deus, um oráculo), você realmente acha que é relevante se alguém fizer uma piada sobre aquilo? Sua fé vai diminuir porque alguém fez uma piada a respeito? Se diminuir, é porque não é fé.

O patrulhamento ideológico esgarçado do "politicamente correto" sempre me irritou.  Não acho certo proibir o humorista X ou Y de chegar perto da celebridade A ou B porque ele fez uma piada sobre ela em seu programa. Se você se sentiu ofendido, busque seus direitos, a retratação pública, se for o caso. Mas proibir, manter afastado ou matar não creio que sejam saídas civilizadas.

Agora, a liberdade de expressão está posta em xeque mais uma vez. Censura é censura, desde o empastelamento de jornais de esquerda, como o Pasquim, até o assassinato das pessoas que trabalhavam no Charlie Hebdo.

E pior: vi gente dizendo "bem feito" para os cartunistas que perderam a vida. Vi gente dizendo: "está errado, mas os cartunistas procuraram sarna para se coçar quando publicaram a charge". Nesse caso, penso eu, não há espaço para "MAS". Não há adversativa possível no terreno da intolerância, do radicalismo. Intolerância e radicalismo  são a porta de entrada para o terror.

E, hoje, o terror ameaça gravemente a liberdade de expressão.

Atualização em 08/01/2015
Desde ontem, várias manifestações pelo mundo têm acontecido em solidariedade às vítimas da barbárie. O presidente francês pediu "unidade" à Nação. Acima de tudo, é preciso ter consciência de que não se pode entrar numa luta contra uma religião, um povo ou uma nacionalidade. Esse crime horrendo foi praticado por um grupo de pessoas, mas o grupo não representa o todo. Excluir e preconceituar também são ferramentas de um discurso de ódio. E, agora, tudo o que mais precisamos é amor.